Quem é você tomando decisões?
Saiba como as indecisões da vida são tratadas na psicologia
Escolher pode ser um inferno. Mesmo que todos os dias da nossa vida envolvam fazer escolhas, para muitas pessoas ter que decidir é extremamente angustiante, e não é raro que procurem clínicas de psicologia buscando ajuda para suas indecisões, e isso realmente pode ser benéfico, mesmo que seja pelos motivos errados. Veja bem, quando um pessoa está procurando ajuda psicológica para tomar uma decisão, os cenários mais comuns são:
Ela já se decidiu, mas quer a validação de um psicólogo para ter certeza que essa é a decisão certa.
Essa é, de certa forma, até um tanto cômica pois, geralmente, ao apresentar suas opções, o indivíduo expõe a que não deseja de forma um tanto quanto desdenhosa, enquanto apresenta com certa veemência a que realmente deseja, quase como se estivesse tentando convencer o ouvinte de que essa é a escolha correta - até óbvia - , e ele está ansiando que concorde com ele. Isso não é sempre óbvio e muitas das vezes é necessário investigar juntamente com ele o motivo de sua inércia frente aos seus desejos, mesmo que ele nem tenha notado que já decidiu o que quer.
Sabe o que quer e quer sua ajuda para não querer mais.
Nem sempre desejamos o que queremos. É contraditório e até mesmo inconveniente essa incongruência entre nossas razões e desejos, e isso pode nos travar e causar sofrimento. Neste cenário, o indivíduo espera que o psicólogo faça com que essa incongruência cesse, que ele não sofra mais, como se num passe de mágica o profissional pudesse mudar o que ele sente e o que quer. Ele sente que está longe do seu ''ideal'' e que o psicólogo precisa dar um jeito de ''consertá-lo''. Mas para o profissional, é ético respeitar a vontade dele de ser ''mudado''? Se ele não for ''mudado'' pode vir a ser um perigo para si ou para outras pessoas?
Essa é a decisão suprema. Se eu escolher errado vai destruir a minha vida.
Catástrofe é o termo mais exato. A situação é tão importante que a pessoa sente que está em uma corda bamba onde não há escapatória e, tomar a decisão errada pode significar que ela será infeliz o resto da vida. Geralmente, esse sentimento já a corrói há um bom tempo, afetando seu apetite, seu sono, sua disposição, sua atenção e sua memória. Não é raro que a ansiedade causada por todo esse estresse leve até a casos de paranoia. É necessário todo um cuidado com o acolhimento e escuta, mesmo que essa decisão não tenha consequências tão devastadoras quanto o que essa pessoa alega, isso é claramente muito importante para ela e deve ser tratada com tal.
Não quero decidir.
Neste cenário a pessoa está presa numa escolha ingrata onde o ''menos pior'' é o melhor que ela consegue, mas no mundo ideal ela nem gostaria de estar escolhendo nada porém, segundo ela, não existe uma outra opção viável. Ou ela acredita que as coisas estão boas do jeito que estão e não vê sentido em mudar e por isso não quer escolher entre uma opção ao invés de outras.
Quero tudo, mas sem me comprometer.
Geralmente ao tomarmos decisões fica implícito que é necessário abdicar de alguma coisa. É uma das lições da vida de que não é possível ter tudo que nós queremos. Mas então aparece uma pessoa disposta compartilhar com você toda a engenharia complexa em que ela consegue tudo o que quer, sem consequências e sem se comprometer com nada. Sinceramente não precisamos ser irredutíveis: sim, é possível alcançar objetivos sem sofrer determinadas consequências, é possível manejar situações para evitar malefícios e potencializar benefícios, mas isso é a exceção nos casos, e é perigosíssimo tentar seguir isso como regra. Assumir a responsabilidade por nossas ações vai além de um sinal de maturidade, é um exemplo de empatia e respeito não apenas por você mas também para outras pessoas.
Essa é uma temática que interessa muito à Psicologia, especialmente a psicologia cognitiva, que está preocupada com as funções mentais, como inteligência, pensamento, linguagem, memória e tomada de decisão. A pesquisa cognitiva demonstrou que o modo de pensar das pessoas sobre as coisas influencia seus comportamentos. Com essas análises nasceram as teorias para explicar os processos de tomada de decisão. Elas tendem estarem em dois grupos: teorias normativas e teorias descritivas. As teorias de decisão normativa definem como as pessoas devem tomar decisões pois, de acordo com elas, os indivíduos sempre escolhem a opção que produz o maior ganho. O problema com esses modelos é que as pessoas nem sempre tomam decisões racionais e nem sempre tomam a decisão “ideal”. Muitas vezes, as teorias normativas não conseguem prever o que as pessoas vão efetivamente escolher. Já as teorias de decisão descritiva visam fazer exatamente isso, focando em opções reais, em vez de ideais, uma vez que, de acordo com elas, as pessoas muitas vezes mostram tendências na tomada de decisão e, mesmo quando entendem as probabilidades, elas têm o potencial de tomar decisões irracionais. Uma teoria normativa de como as pessoas devem tomar decisões é a teoria da utilidade esperada de Neumann & Morgenstern. De acordo com esse modelo, as pessoas tomam decisões considerando as possíveis alternativas e escolhendo o caminho mais desejável. Por exemplo, elas podem classificar as alternativas em ordem de preferência: uma determinada alternativa é mais desejável, menos desejável ou igualmente desejável em comparação à alternativa concorrente? A maneira racional de decidir seria ranquear essas alternativas e escolher aquela com a maior utilidade ou valor para você. Mas as pessoas sempre escolhem a alternativa mais desejável? Desde que a teoria da utilidade esperada foi proposta, foram observados muitos padrões de comportamento intrigantes e inconsistentes com ela. Pois é um erro crer que os seres humanos são totalmente racionais.
Por isso existem muitas explicações dentro da psicologia para a explicar como os seres humanos tomam decisões e aqui temos um cardápio variado de explicações:
A Psicanálise no geral, defenderá que nosso inconsciente define nosso comportamento e nossas decisões, por isso o que queremos e os motivos disso não são facilmente acessíveis para nós.
Behavioristas dirão que o ambiente e a aprendizagem influenciam nossas escolhas, ou seja, tomamos decisões baseados no que aprendemos anteriormente, pelas consequências de nossas escolhas.
A Psicologia Social defenderá que tomamos decisões baseados em atalhos mentais chamados heurísticas que são influenciadas pela sociedade em que a pessoa vive
A Sócio-Histórica dirá que o ambiente e a cultura definirão nossas escolhas. A tomada de decisão está atrelada a valores culturais e contextuais do individuo.
Neurocientistas como Robert Sapolsky diriam que nossas escolhas estão determinadas por uma complexa mistura de genética, epigenética, cultura e o livre-arbítrio não existe.
Humanistas defenderiam que todos temos uma tendência à conclusão e nossas decisões são guiadas a realização de nossos potenciais, buscando a autorrealização
Enfim, estão todos certos? Estão todos errados? Todas as respostas são válidas dependendo do contexto? Bem-vindo a uma das maiores discussões dentro da Psicologia! O que tudo isso mostra é que seres humanos são complicados por natureza e existem muitas perspectivas possíveis para analisar o processo de tomada de decisão de alguém. Pessoalmente gosto da perspectiva de que pessoas tomam decisões baseadas no que elas acreditam que é certo ou errado ou de acordo com as consequências de suas decisões.
Certo e errado podem ser muito variáveis, e muitas pessoas são extremamente intransigentes com isso. São pessoas que não se importam com as consequências do que escolhem, mesmo que seja inconveniente para elas ou para os outros, essa é a decisão que vão tomar e ponto final. Aos olhos de terceiros isso pode ser visto como positivo e até desejável, mas pode levar a decisões precipitadas sem avaliação ou validade, ou a serem tendenciosos e basearem suas decisões apenas para confirmarem suas próprias crenças, sendo muito limitados em sua visão de mundo, além de pouco críticos em seus valores, não sabendo se os mesmo são próprios ou herdados de forma acrítica de seu ambiente. Pessoas que decidem de acordo com as consequências, geralmente o fazem depois de avaliar e ponderar. Podem ser pessoas que possuem uma abertura maior para contextos e a resolução de problemas, mas podem ser vagarosas e por vezes tardias em suas decisões, além de se preocuparem excessivamente com a opinião de terceiros, o que os deixa muito ansiosos. Sem falar que a vida é cheia de fatores que não se pode controlar e prever, o que pode levar a frustração se as coisas saírem do planejado. Mas também podem não ser muito empáticas priorizando sempre ganhos pessoais em detrimento de outros, e por isso buscando sempre uma vantagem.
Isso não é uma categoria pois, na maioria das vezes somos guiados por ambas. Às vezes decidimos baseados em nossos valores, às vezes tendemos a decidir pois acreditamos que teremos determinados resultados. Uns mais do que outros, uns tendo mais de um do que outro, pois somos complexos e contraditórios e mesmo com várias teorias e perspectivas, tomamos decisões erradas. Mas não há maneira mais humana de viver do que essa. Tão importante quanto se decidir, é ter a responsabilidade por essa escolha, é viver com as consequências do que escolheu ou deixou de escolher. Com alegrias e tristezas, conquistas e perdas, seja autentico nas suas escolhas. Faça as coisas do seu jeito.
Li esse texto sentindo como se eu tivesse fazendo um teste psicológico com as respostas nele haha.
Refleti e vi que estou entre “essa é a decisão da minha vida e não posso falhar” e “não quero decidir nada”. No fim o entendimento por trás dessas decisões se encaixam bem com a minha vida.
A psicologia é uma coisa interessante.
Ótimo o seu texto!