Como não ser um ignorante
Você é capaz de identificar seus pontos fracos? Será que você não está superestimando suas capacidades? Um guia para evitar o efeito Dunning-Kruger.
Ninguém quer ser um idiota. Não saber mexe com alguns dos medos mais profundos do ser humano: o medo de estar sendo enganado e estar tomando as decisões erradas. Por isso usamos nossas capacidades de raciocínio e todo um sistema muito particular para decidirmos nossas ações. Contudo, a razão humana não é à prova de falhas e é muito comum que as pessoas considerem suas habilidades, qualidades ou características acima do que realmente são. O mais perigoso disso é que a ignorância impede a avaliação correta das próprias limitações criando uma distorção de julgamento que pode levar a erros grotescos que não ocorreriam em situações normais, sendo esse fenômeno um viés cognitivo conhecido como efeito Dunning-Kruger, que é mais comum do que se imagina. Nesse cenário é necessário nos prevenirmos, e por isso listei uma série de atitudes para se proteger da ignorância.
1 . Assuma sempre que você não sabe o suficiente
o hábito de ponderar cuidadosamente os fatos ao decidir em que acreditar, questionar sistematicamente, avaliar a informação com base em evidência bem-sustentada e ser um pensador crítico envolve procurar ‘furos’ nas evidências, empregando a lógica e o raciocínio para averiguar se a informação faz sentido, bem como considerar explicações alternativas, e também requer considerar a possibilidade de a informação ser tendenciosa por influência, pois a maioria das pessoas são rápidas para questionar informação que não se ajusta a suas crenças. A capacidade de pensar dessa forma é denominada pensamento crítico e demanda questionamento saudável e uma mente aberta. Ele é útil em todos os aspectos da sua vida, por isso é importante verificar seus preconceitos. Pergunte a si mesmo: a minha crença ainda é verdadeira? O que me leva a crer nisso? Quais são os fatos que sustentam isso? A ciência produziu novas descobertas que exigem de nós a reavaliação e atualização de nossas crenças? Esse exercício é importante porque você pode estar menos motivado a pensar de forma crítica sobre a informação que é contrária ao que você acredita primariamente.
2 . Não acredite em tudo que você pensa
As pessoas mostram uma forte tendência a dar muita importância à evidência que sustenta suas crenças e tendem a subestimar a evidência que não corresponde àquilo em que acreditam, sendo mais propensas a acreditar no mérito de uma informação ou explicação que é consistente com suas crenças. É importante ter cuidado com as fontes de informação pois se nos restringirmos às evidências que sustentam nossas perspectivas, é claro que acreditaremos que estamos certos. De modo similar, as pessoas mostram memória seletiva, tendendo a lembrar melhor a informação que sustenta suas crenças, este é o viés de confirmação.
3 . Assegure-se da credibilidade de sua fonte
Todos os dias somos assediados por informações novas, especialmente nas redes sociais, e assim surge o questionamento: em quem você pode confiar? As fontes, mesmo de especialistas, devem ser capazes de justificar suas alegações e, ao mesmo tempo, você deve estar atento aos apelos de autoridade, como ocorre quando as fontes se referem ao conhecimento delas e não a evidências, usando a opinião de uma autoridade para apoiar um argumento, sem fornecer justificativas ou uma correlação direta.
4 . Cuidado com as estatísticas
Existem três tipos de mentiras: mentiras, mentiras deslavadas e estatísticas. Em geral, as pessoas falham em compreender ou usar a estatística ao tentar interpretar os eventos ao seu redor. Pode-se usar da estatística para correlacionar eventos ou situações de maneira enganosa ou propor uma lógica falsa para resolver um problema sério. É importante sempre ter em mente que estatísticas precisam de um contexto para fazer sentido.
5 . Sua percepção pode te enganar
Um erro de raciocínio extremamente comum é a percepção equivocada de que dois eventos acontecendo ao mesmo tempo devem ter alguma relação. Em nosso desejo de descobrir a previsibilidade no mundo, às vezes enxergamos ordem onde não há e acreditamos que eventos estejam relacionados quando na verdade não estão, podendo levar a um comportamento supersticioso. Muitas vezes, eventos que parecem estar relacionados são apenas coincidência.
6 . Cuidado com comparações relativas
O enquadramento determina as comparações relativas que são feitas pelas pessoas. Por exemplo: a informação que chega primeiro exerce forte influência sobre o modo como as pessoas fazem comparações e as pessoas tendem a preferir a informação que é apresentada de forma positiva, em vez de negativa, assim, a forma como observamos os eventos afeta nossa capacidade de interpretá-los.
7 . Seja cauteloso com explicações post factum:
As pessoas geralmente esperam que o mundo faça sentido, por isso surgem muitas explicações para os motivos da ocorrência dos eventos depois que eles ocorreram. Podemos agir assim até mesmo quando temos uma informação incompleta. Essa forma falha de raciocínio é conhecida como viés de retrospectiva. Somos muito bons para explicar por que as coisas aconteceram, mas somos muito menos bem-sucedidos em prever eventos. De modo mais geral, depois que sabemos o desfecho, interpretamos e reinterpretamos evidências antigas para dar-lhe sentido. Precisamos desconfiar das explicações pós-fato, porque tendem a distorcer a evidência e criar uma falsa previsibilidade.
8 . Cuidado com os atalhos mentais
Temos tendência a simplificar as coisas e muitas vezes seguimos regras simples baseadas em nosso histórico de vida para tomar decisões. Esses “atalhos” mentais são valiosos porque, com frequência, produzem decisões razoavelmente boas sem esforços grandes demais, porém podem levar a julgamentos imprecisos e resultados tendenciosos e rasos.
9 . A resposta mais fácil nem sempre é a correta
Geralmente tomamos uma decisão com base na resposta que vem mais facilmente à mente, pois quando pensamos sobre eventos ou tomamos decisões tendemos a confiar na informação que é fácil de recuperar. Porém, nosso conhecimento está ancorado em nossa visão de mundo, então em determinados contextos a resposta que vem mais rápido não é adequada para aquele contexto.
10 . Cuidado com suas generalizações
Temos a tendência de categorizar uma pessoa ou objeto com base em nossas preconcepções, e isso vale para comportamentos e situações. O ponto é que, nem tudo que parece é, e quando baseamos uma decisão nessas generalizações isso reflete o que já acreditamos sobre uma situação, sequestrando nossa capacidade de pensar criticamente e tornando nossas decisões enviesadas.
11 . Cuidado com suas expectativas
No geral, não percebem o quão ruins somos em predizer nossos sentimentos futuros. Muitas vezes decidimos fazer coisas que acreditamos que nos tornarão felizes, enquanto evitamos aquelas que nos arrependeremos. E até este ponto não tem nada de errado, mas tendemos a superestimar como os eventos irão nos fazer sentir no futuro. Dessa forma, as expectativas de como seremos felizes no futuro modulam nossas decisões, mas não raramente, quando os eventos acontecem e objetivos são alcançados, são comuns os relatos de pessoas que esperavam estar mais felizes e até mesmo de decepção. Portanto, module suas expectativas.
Esses erros de raciocínio não ocorrem por falta de inteligência ou motivação, mas exatamente o contrário: a maioria deles ocorre porque nós estamos motivados a usar nossa inteligência. Nós queremos dar sentido aos eventos que nos envolvem e que acontecem ao nosso redor. Por isso é vital que estejamos atentos para a possibilidade de estarmos falhando em enxergar as nossas próprias inadequações. Nosso cérebro é altamente eficiente em encontrar padrões e fazer conexões entre as coisas, e ao usarmos essas habilidades, podemos cometer erros, mas também conseguimos fazer novas descobertas e avançar a sociedade. Todo mundo pensa que é melhor do que a média em algum aspecto. Somos motivados a nos sentir bem sobre nós mesmos e essa motivação afeta nosso modo de pensar, sustentando nossas próprias perspectivas positivas. O ‘fator excesso de confiança’ promove frequente a dificuldade que as pessoas têm para reconhecer seus próprios pontos fracos. Podemos chamar esse fenômeno de viés de autosserviço ou efeito Dunning-Kruger.
Ao contrário do que aparenta, não estou defendendo uma extrema racionalização da sua vida, nós não somos seres puramente racionais, e é bom que não sejamos assim, todos nós vivemos entre eros e psique e é da relação delas que podemos fazer coisas incríveis.
É possível ter a autoconfiança elevada e ao mesmo tempo se sentir incapaz e inseguro? Pois eu siu assim e não sei se é pela bipolaridade ou se é pela variação de temas, assim eu me sinto confiante sobre alguns e sobre outros não.
De qualquer forma, tem dias que sinto que sou capaz de tudo e minha confiança intelectual está altíssima e tem dias que sinto não ser capaz de nada.
Incrível como parece que as redes sociais foram feitas para nos fazer cair em todas essas armadilhas. A terceira dica é uma que sempre preciso tomar mais cuidado, pois acabo esquecendo ou deixando para lá, e quando vejo, cai em mais uma, pois acreditei em uma fonte que não era 100% confiável e acabei repassando o erro.
Excelente texto como sempre!
PS: Adorei a escolha de Stanczyk de Jan Matejko como capa. É uma das pinturas que mais gosto. Tem total relação com o tema da sua postagem.